"Ivanhoe" é um romance histórico de Sir Walter Scott, publicado em 1819, que se tornou uma das obras mais populares e influentes da literatura inglesa do século XIX. Ambientado na Inglaterra do século XII, durante o reinado de Ricardo Coração de Leão, o romance marca uma mudança significativa na obra de Scott, sendo seu primeiro romance a tratar da história inglesa medieval em vez da escocesa moderna.
A narrativa se desenvolve no período turbulento que se seguiu à Terceira Cruzada, quando o rei Ricardo I estava ausente da Inglaterra e o país sofria sob a regência de seu irmão, o príncipe João. Scott utiliza este contexto histórico para explorar as tensões entre saxões e normandos, cristãos e judeus, além das complexas dinâmicas de poder que caracterizavam a sociedade feudal medieval.
O protagonista, Wilfred de Ivanhoe, é um jovem cavaleiro saxão deserdado por seu pai Cedric devido ao seu apoio ao rei normando Ricardo e seu amor por Rowena, pupila de Cedric que este pretende casar com Athelstane para restaurar a linhagem real saxônica. Ivanhoe retorna secretamente das Cruzadas disfarçado como um cavaleiro desdentado, participando de um torneio em Ashby-de-la-Zouch onde derrota os cavaleiros normandos, incluindo o temível Brian de Bois-Guilbert.
O romance apresenta uma galeria memorável de personagens que se tornaram icônicos na literatura inglesa. Robin Hood aparece como Locksley, o arqueiro habilidoso que lidera os proscritos da floresta de Sherwood. Isaac de York e sua filha Rebecca representam a comunidade judaica medieval, permitindo a Scott explorar temas de tolerância religiosa e preconceito. Rebecca, em particular, emerge como uma das heroínas mais complexas e admiráveis da literatura romântica, combinando beleza, inteligência, coragem e profunda fé religiosa.
A estrutura narrativa de "Ivanhoe" é episódica, alternando entre cenas de ação espetacular e momentos de reflexão moral e social. O famoso torneio de Ashby, o cerco ao castelo de Torquilstone e o julgamento de Rebecca por bruxaria constituem alguns dos episódios mais memoráveis da literatura de aventura. Scott demonstra particular maestria na descrição de combates medievais e cerimônias feudais, criando um senso vívido de autenticidade histórica.
O romance explora profundamente as tensões étnicas e culturais da Inglaterra medieval. A rivalidade entre saxões e normandos serve como metáfora para conflitos mais amplos sobre identidade nacional e assimilação cultural. Scott apresenta uma visão relativamente progressista para sua época, defendendo a eventual reconciliação entre os grupos étnicos e sugerindo que a verdadeira nobreza reside no caráter individual rather than na origem racial ou social.
A questão judaica recebe tratamento particularmente sensível e avançado para o período. Através de Isaac e Rebecca, Scott critica o antissemitismo medieval e apresenta personagens judeus como figuras dignas de simpatia e admiração. Rebecca, especialmente, transcende os estereótipos da época, sendo retratada como moralmente superior a muitos dos personagens cristãos. Sua rejeição final de Ivanhoe e sua decisão de dedicar-se à medicina representam uma afirmação de dignidade e independência notável para uma heroína do século XIX.
O tema do amor cortês é explorado através do triângulo amoroso entre Ivanhoe, Rowena e Rebecca. Enquanto Rowena representa o amor convencional e socialmente aprovado, Rebecca encarna uma paixão mais intensa e espiritualmente elevada. A impossibilidade de união entre Ivanhoe e Rebecca devido às barreiras religiosas adiciona uma dimensão trágica ao romance que eleva sua qualidade artística acima da mera aventura.