Ouvir o André Lara Resende era uma ambição antiga. No Brasil, onde tudo se polariza, a economia não escapa ao padrão. Sendo uma consequência de escolhas baseadas em valores e interesses, a economia é, essencialmente, uma versão quantificada da política. Escolhas frouxas e baseadas em generosidade fácil, via de regra populistas, começam em festa e terminam em tragédia. O governo Dilma é um exemplo recente. O da Argentina, um padrão que perdura. Governos que invocam austeridade fiscal e repousam a responsabilidade da vida coletiva nas escolhas exclusivamente individuais, além de desconsiderarem a brutal assimetria no acesso às oportunidades, costumam começar bem e terminar em farsa, se não forem interrompidos pela tragédia. Ao longo do século passado nos acostumamos a ver populistas contra fiscalistas, Keynesianos versus seguidores de Milton Friedman. Em nenhum desses arquétipos se poderia ser, ao mesmo tempo, socialmente sensível com os excluídos e responsável na gestão das finanças. O que o André Lara Resende tem dito é o oposto do que falam os economistas entrincheirados nos polos. Para ele, é possível ser sensível aos marginalizados e manter compromisso com a gestão fiscal responsável, contanto que se supere a fossilização dos conceitos econômicos ultrapassados. Ou seja, as duas preocupações, a social e a fiscal, não apenas podem ser endereçadas em conjunto, como a política economía deve dispor de instrumentos que viabilizam o financiamento, pelo estado, de atividades emuladoras do desenvolvimento. Não é a poupança que viabiliza o investimento, mas o investimento é que cria a poupança. André, como o prêmio Nobel Paul Krugman nos US, defende que o estado PRECISA produzir dívida para gerar capacidade de investimento, e que isso é o que gerará poupança da sociedade. Alguns se escandalizaram, foi exorcizado por outros, mas, aos poucos, os principais economistas do FMI, do Tesouro Americano e até do Banco Central da Índia, nesses tempos de pandemia, passaram a formular políticas na mesma direção. Em pouco tempo, André saiu da condição de “excluído” para interlocutor preferido por intelectuais, investidores e gestores. Não foi uma conversa fácil, nem simples, para mim. O tema é complexo, e André um pensador sofisticado. Foram duas horas que editamos para compactar em dois episódios de 50 mins. Vale como instrução atual, vale como registro de um pensamento rico e original. Como frustração, fiquei sem falar sobre o que tinha me preparado e lido, a vida do escritor Otto Lara Resende, pai do André, que, com sua pena delicada e precisa, trafegava pela erudição com a simplicidade que só os mineiros da gema tem. Fica para o próximo encontro.