De uma hora para outra a toxicidade de Bolsonaro se espalhou. Todos agora se esforçam para emitir ultimatos e desfiar xingamentos. Empresários. Banqueiros. Economistas liberais. Jornalistas que sempre exerceram o ventriloquismo da voz do dono. Juristas e juízes que utilizavam a defesa das instituições como anteparo para a leniência e, muitas vezes, contraditoriamente “pedindo vistas” para fechar os olhos. Políticos que pegaram o vácuo do presidente até o mês passado para ganhar cargos na direção do Congresso agora acendem luzes amarelas de indignação. Percebem que o navio afunda e se agitam. Como ratos.
Pode parecer uma boa notícia, já que avoluma a onda que pode levar a contenção do desvario administrativo e da insensibilidade humana – poucas figuras unem de forma tão íntima a incompetência e a maldade como Bolsonaro –, ao fortalecimento de uma alternativa em 2022 e até mesmo ao afastamento imediato do presidente. A revolta dos roedores traz um impulso novo, sobretudo pela capacidade que tem de se retroalimentar com a modelagem revista da parceria entre a parcela desagradada da elite e a imprensa corporativa.
Não dá para levar a sério críticas de quem ajudou a exterminar a democracia brasileira com o golpe contra Dilma Rousseff e pavimentou a eleição de Bolsonaro, sabendo de tudo que ele era capaz, e que agora se apresenta como representante da racionalidade e da defesa da vida e da economia. Agiram, deliberadamente, contra a razão como expressão de interesses universais, contra a vida digna da maioria da população e em detrimento de uma economia voltada para a autonomia, sustentabilidade e distribuição de renda. Eram, então, inimigos do povo brasileiro. E, em essência, ainda o são.
Destruíram as instituições democráticas, patrocinaram a extirpação de direitos trabalhistas e sociais, retiram o país da trilha das economias autônomas. Atacaram programas sociais, foram participantes dos propósitos de abrandamento da legislação ambiental. Muitos cerraram fileiras contra movimentos sociais, atuam para criminalizar as organizações populares e a reforma agrária. Foram – e permanecem em grande medida – partidários do armamento da população e da terra-sem-lei da segurança pública impune em sua tarefa de esculachar pobres e pretos, em conluio com a mecânica miliciana de domínio dos territórios pelo medo.
Para piorar, são os mesmos grupos que, ciosos de sua modernidade em comportamento e artes, deixaram correr solto o preconceito, a censura, o moralismo e a destruição do pensamento crítico. Agiram como quem dá os dedos dos costumes para preservar o braço forte dos interesses do mercado. Foi preciso que a ação anticivilizatória chegasse aos seus negócios, no caso da indústria cultural, para que esboçasse uma reação que não se viu quando o ministério da Cultura e a pasta dos direitos humanos (rebatizada e ampliada para abrigar Damares) foram extintos e as áreas entregues seguidamente a pessoas ignorantemente patéticas, fundamentalistas, racistas, filonazistas ou todas essas barbáries juntas.
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