Há seres humanos que se prostram de joelhos à espera do fim com resignação, ou que buscam se congraçar com o verdugo. Há outros — ao menos — que intentam correr, escapar. Intentam ser livres e viver durante vinte metros. É pouco, porque o tiro, afinal, abate igual. Porém, durante esses vinte metros que corre, o ser humano é livre; esses vinte metros se chamam amor, amizade, dignidade, decência, caridade, honradez, coragem, compaixão, solidariedade. Nesses vinte metros, aparentemente muito curtos, o ser humano pode fazer muitas coisas importantes. Toda a diferença entre os homens — para mim — reside em como corre ou não corre esses vinte metros. Isso é o livre-arbítrio possível dentro das regras gerais de um universo que não tem sentimentos. Fomos educados para um mundo que não existe, para uma vida que nunca virá. Há um movimento aparvalhado de coisas inúteis e supérfluas, abobalhadas, papalvas, néscias e, enquanto isso, não sabemos o que fazer com os [nossos] sentimentos.
Música: The Road [Sophie Hutchings] in piano. Yonder, 2017.