Antes de saber ler e escrever, falava imagens. Era a minha forma de comunicar. Desenhava e partilhava tudo o que via e sentia, na esperança do mundo me perceber. É o que todos fazemos. Para nos sentirmos vivos e presentes. Depois, veio verbo e o prazer de abrir um livro para viajar. Foi uma descoberta surpreendente, que me deixou feliz. Deixei de estar apenas num lugar e o mundo passou a caber-me na palma da mão. Aprendi os países, as cidades, as capitais, os rios e as montanhas. De repente, cresci e soltei-me como um gigante que descalça o mar e afasta as nuvens para passar. Bastava estender um braço para alcançar as estrelas e os planetas! Nunca mais parei de ler. Nunca mais parei de brincar com as palavras. Algumas são tão gulosas, que não conseguimos deixar de provar. Queremos sempre mais, até ficamos rechonchudos com as capitulares. Foi na leitura que descobri a fonte prodigiosa onde conseguia beber palavras. Saciei a minha sede de comunicar e resolvi começar a escrever. Já dizia o meu avô que, para trabalhar como deve de ser, temos de nos alimentar a preceito. Pois a leitura é isso: o sustento da escrita. (...)