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Sem insumo, equipes tiveram que ventilar manualmente pacientes internados na UTI; secretário da saúde fala em colapso do sistema de fornecimento

Com a nova explosão de casos de covid no Amazonas, o estoque de oxigênio acabou em vários hospitais de Manaus nesta quinta-feira, 14, levando pacientes internados à morte por asfixia, segundo relatos de médicos que trabalham na capital amazonense. O governo federal anunciou que vai transferir pacientes para outros Estados.

O Hospital Universitário Getúlio Vargas, ligado à Universidade Federal do Amazonas (UFAM), ficou cerca de quatro horas sem o insumo na manhã desta quinta, o que gerou desespero entre os profissionais, segundo relatou ao Estadão uma médica da unidade, que não quis de identificar.

"Colegas perderam pacientes na UTI por causa da falta de oxigênio. Eles ainda tentaram ambuzar (ventilar manualmente), mas foi só para tentar até o último recurso mesmo, porque é inviável manter isso por muito tempo. Cansa muito, tem que revezar os profissionais. Chamaram residentes para ajudar na ventilação manual. A vontade que dá é de chorar o tempo inteiro. Você vê o paciente morrendo na sua frente e não pode fazer nada. É como se ver numa guerra e não ter armas para lutar", disse.

Diversos relatos que circulam nas redes sociais dão conta de que a situação é crítica e centenas de pessoas internadas correm risco de morrer. "O Getúlio Vargas está sem oxigênio e todos os pacientes estão sendo ambuzados (ventilação manual). Se alguém puder ajudar para fazer o revezamento para ambuzar no CTI no quinto andar, por favor, estamos necessitando", afirma um médico, em um alerta que circulou pelas redes sociais e confirmado ao Estadão por profissionais que trabalham no hospital.

Ambuzar é uma expressão usada para a oxigenação mecânica em que um profissional precisa ficar bombeando um balão de oxigênio com as mãos, o que é exaustivo e precisa de revezamento constante.

Segundo a médica ouvida pela reportagem, o Getúlio Vargas recebeu, por volta das 12 horas, alguns cilindros de oxigênio, mas a estimativa era a de que eles seriam suficientes para apenas duas horas.

De acordo com relatos de outros profissionais de saúde da cidade postados nas redes sociais, a maioria dos hospitais sofre o mesmo problema. Há registro de falta do insumo nos hospitais Fundação de Medicina Tropical e nos serviços de pronto-atendimento (SPAs) da capital amazonense.

O procurador de Justiça Públio Caio Dessa Cyrino, que tinha um filho internado no Hospital Fundação de Medicina Tropical, disse ao Estadão que pela manhã não havia oxigênio para nenhum dos pacientes. "Minha nora me ligou às 5h, quando ela foi lá visitá-lo, avisando que tinha acabado. Ele estava no terceiro dia de UTI e evoluindo bem. Por sorte eu tinha uma 'bala' de oxigênio em casa e corri para o hospital para levar para ele. Quando cheguei com a bala na mão, vi o olhar de desespero dos médicos, servidores. Eles estavam em choque, sem poder fazer nada."

Cyrino conta que o filho, de 36 anos, começou a se sentir mal há quase duas semanas, mas logo no início não achou vaga em hospital e ficou em home care, por isso ele tinha oxigênio. "Isso aqui é uma praça de guerra. E esse governo irresponsável não se planejou para a guerra, apesar de saber que ela iria ocorrer", disse.

Ele conseguiu contratar uma UTI aérea e ia transferir o filho para São Paulo agora à tarde. "Eu consegui, mas quantas centenas não têm como fazer isso e podem morrer hoje?"