Um exemplo de procedimento científico foi a descoberta, no começo do século 19, da importância da higiene na Medicina. Nessa época, no Hospital Geral de Viena, cerca de 25% a 30% das mulheres que tinham bebês eram acometidas por uma doença grave, conhecida como febre puerperal. O médico húngaro Ignác Fulop Semmelweis notou que a incidência da doença era mais elevada quando o parto era assistido por professores e estudantes de medicina do que quando era assistido pelas enfermeiras. Qual seria a explicação para essa diferença? Sendo um adepto do procedimento científico, Semmelweis passou a reunir todos os fatos relacionado com a febre puerperal a fim de obter uma explicação. Dois fatos principais chamaram sua atenção: Fato 1. A febre puerperal ocorria principalmente no ambiente hospitalar; mulheres que davam à luz em casa quase nunca apresentavam a doença. Fato 2. Na ala das enfermeiras, muitas das mulheres assistidas permaneciam deitadas de lado durante o parto, enquanto na ala dos médicos e estudantes a parturiente sempre permanecia deitada de costas. Com base nesses fatos, Semmelweis levantou a seguinte hipótese: dar à luz deitada de costas, no hospital, aumenta o risco de ter febre puerperal. Para testar a validade de sua hipótese, Semmelweis fez a seguinte previsão: se os partos realizados na ala dos médicos passarem a ocorrer com as parturientes deitadas de lado, a incidência de febre puerperal deve diminuir, tornando-se semelhante à da ala das enfermeiras. Ele convenceu alguns médicos a adotarem o procedimento usado pelas enfermeiras, isto é, deitar de lado as parturientes, de modo que pudesse testar sua hipótese. Entretanto, isso não reduziu em nada a incidência da doença. Assim, a previsão não se confirmou e a hipótese foi rejeitada. Continuando a investigar o assunto, ele tomou conhecimento de um fato novo, que sugeria uma nova explicação para a febre puerperal: Fato 3.Um médico cortou-se com o bisturi, enquanto dissecava um cadáver, vindo a morrer com os mesmos sintomas da febre puerperal. Ligando esse novo fato aos anteriores, Semmelweis teve o palpite de que a enfermidade das parturientes podia ser causada por algo presente nos cadáveres que, de alguma maneira, era transmitido a elas. Seguindo essa nova pista, o médico lembrou-se de outro fato: Fato 4. Os médicos e os estudantes de medicina cuidavam das parturientes logo após terem dissecado cadáveres nas aulas de anatomia; eles não lavavam as mãos nem os instrumentos cirúrgicos entre as duas atividades. Com base nesses fatos novos, Semmelweis formulou uma nova hipótese: a febre puerperal é caudada por alguma matéria presente nos cadáveres, transmitida às parturientes por médicos e estudantes, pelas mão e por instrumentos cirúrgicos contaminados. Se essa nova hipótese fosse verdadeira, poderia-se fazer a seguinte previsão: se médicos e estudantes lavassem bem as mãos e os instrumentos cirúrgicos antes de atenderem as parturientes, a incidência de febre puerperal deveria diminuir. Com muito custo, Semmelweis convenceu alguns médicos e estudantes a lavarem as mãos com solução de cloro antes de atenderem as parturientes. O resultado foi que, entre as pacientes assistidas pelos que adotaram essa prática, a doença desapareceu. Em vista desse resultado, ele aceitou a nova hipótese como a explicação para a origem da doença. Os procedimentos de Semmelweis não convenceram a maioria de seus colegas médicos, incapazes de compreender e de aceitar as evidências. Somente anos depois, os princípios de higiene passaram a ser adotados na maioria dos hospitais da Europa. Hoje sabemos que a febre puerperal é causada por microrganismos que proliferam nos cadáveres e não por matéria cadavérica, como Semmelweis havia pensado. Isso mostra uma das grandes vantagens do procedimento científico: mesmo sem saber a “verdade” completa sobre os fatos, é possível adotar um procedimento adequado, com base nas previsões a partir de hipótese.