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"Olha, eu tô trabalhando no Butantan desde 1972. De viver no Butantan com meu pai aí vai muito mais no tempo né, no início da década de 50. Mas eu voltei para o Butantan [como] funcionário né. Todo mundo fala que era feliz e não sabia né. Eu me lembro que a minha mãe... Agora já não é tanto, que ela já não tá tão ligadinha mais, né. Eu falo para minha mãe assim 'mãe, a senhora tem 96 anos'. Ai ela fala para mim assim 'ah, é?!'. (risos) Quando ela tinha até uns 89, eu falava assim 'mãe, o que que a senhora precisa? O que que a senhora quer?'. Aí ela falava para mim com uma puta de uma humildade, uma doçura, ela falava assim (voz fina) 'eu queria só mais um dia', ela dizia. E você sabe que isso daí eu falava pensando com os meus botões né. Como eu gosto muito de fotografia né, eu sempre pensava 'pô, eu queria uma máquina, um monte de objetiva' e ela só um dia, que é uma coisa tão trivial ter um dia, né? É isso que acontece com a gente né. A gente não dá valor para trivialidade, que é uma coisa maravilhosa você poder ter um dia, poder ir no supermercado ver as crianças, dá uma sentadinha no parque para ver as crianças correndo. Isso a gente não dá o mínimo valor. Eu fiquei... Quando eu tava indo lá, pensei 'pô eu vivi esse tempo todo e nunca valorizei nada. Agora que veio a pandemia que vem cair a ficha'. (risos) É, cair a ficha. Exatamente o que aconteceu né. Foi exatamente o que aconteceu. Caiu a ficha".

CARLOS JARED, 64 anos, em conversa no dia 9 de junho de 2021.

Transcrição da conversa: https://saopauloisolada.com.br/2021/08/04/a-gente-nao-da-valor-para-trivialidade/