"Assim, eu acompanhei duas mortes de muito, muito, muito próximo. Eu acompanhei a do meu avô, que ele teve mais de um ano para se despedir da gente. Ele queria milho, queria ver galinha, queria plantar mandioca. A gente mimou o nosso velhinho até onde deu. Com relação ao meu pai, ele foi para o hospital, saiu, e a gente não viu mais. Não teve isso da gente se despedir, não teve... Eu queria muito assistir um filme antes dele ir, eu queria comer um pastel, e isso foi tirado da gente. Isso é muito desumano. Eu sei que tem pessoas com situações muito piores, mas isso é uma cicatriz que muitas pessoas vão carregar, e a gente sabe que podia ter sido diferente. E por mais que tenha sido em março, é um pesadelo diário. Eu queria muito falar: 'Nossa, mas eu a gente já tá melhor'. Eu não tô. Eu lembro que no dia que eu recebi a notícia eu tava no quarto, eu não consegui dormir no dia. O meu quarto fica uns cinco cômodos de distância da sala, que era onde minha mãe tava dormindo. Eu ouvi o celular dela tocar de longe, e depois do meu irmão no quarto dele, e depois o meu celular tocou, pedindo para gente ir lá para o hospital. E eu não tenho mais coragem de deixar meu celular tocar. É um pesadelo que a gente vive diariamente".
ERICK CHAGAS, 28 anos, em conversa no dia 6 de julho de 2021.