A palavra inovacionismo tem sido empregada para designar de forma pejorativa a ideia de que políticas, ações e investimentos públicos devem privilegiar as investigações que estão nos últimos níveis da escala TRL, gerando produtos rentáveis. Embora seja impossível deixar de admitir que a inovação e o processo de transferência de tecnologia constituem gargalos da cadeia do conhecimento no Brasil, o inovacionismo traz consigo algumas contradições intrínsecas que em última instância prejudicam o próprio movimento de inovação.
Em primeiro lugar, parece óbvio que, para que uma boa ideia se encontre no nível 9 da escala TRL, algum dia ela tem que ter passado pelos níveis 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8 da escala. Portanto, parece óbvio que uma boa ideia precisa ser apoiada ao longo de todo o processo, para que eventualmente se transforme em um produto comercial e não morra ao longo da cadeia. Logo, os investimentos e políticas públicas precisam ser feitos de forma equilibrada para apoiar ações em todos os níveis de desenvolvimento científico e tecnológico.
A ideia de que só devem ser feitos investimentos nos últimos níveis da escala TRL admite implicitamente que existe um estoque infinito de boas ideias apenas aguardando a oportunidade de serem transformadas em produto. No entanto, nada parece dar suporte a essa ideia; muito pelo contrário, o estoque de boas ideias é pequeno e fugaz, sendo necessário preencher esse estoque todo o tempo.
O estoque de boas ideias é fugaz até porque o investimento privado (que no Brasil é muito pequeno) na cadeia do conhecimento se concentra nos últimos níveis da escala TRL, quando boa parte dos riscos de desenvolvimento já foi suprimido ou mitigado. Portanto, a disponibilidade financeira privada aumenta ao longo da escala TRL, tornando ainda mais importante a participação dos recursos públicos nos níveis mais baixos do desenvolvimento científico e tecnológico.
Finalmente, por conta dos riscos naturais do processo de investigação, é necessário que muitas ideias sejam apoiadas simultaneamente para que uma delas venha a se transformar em um bom produto comercial. Assim, há uma espécie de pirâmide em que o número de boas ideias vai diminuindo, à medida que avançamos na escala TRL, o que torna necessário o afluxo contínuo de incentivos para as investigações conduzidas nos níveis básicos da escala, para que ao menos algumas boas ideias possam um dia se transformar em produtos.
Por tudo o que foi exposto, políticas públicas de inovação não podem ignorar de forma alguma os investimentos em ciência básica e nos níveis intermediários da escala TRL. É necessário, portanto, que as políticas e investimentos públicos sejam feitos de forma continuada ao longo de toda a escala do conhecimento. Lembrando sempre que, como dizia meu velho pai, tudo o que é demais é sobra.
https://youtu.be/lfAflltkxiw
https://youtu.be/6Wvqn1hXSy0
https://www.ihu.unisinos.br/categorias/159-entrevistas/621013-inovacionismo-causa-distorcao-nas-universidades-a-supervalorizacao-das-areas-com-capacidade-de-produzir-invencoes-rentaveis-entrevista-especial-com-marcos-barbosa-de-oliveira
https://outraspalavras.net/tecnologiaemdisputa/em-busca-de-uma-alternativa-ao-inovacionismo/