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A dor em 3 atos

1°Ato: A Filosofia
Schopenhauer influenciado pelo conceito budista, coloca a existência como uma constante busca pelo fim da dor. Talvez ele não tenha entendido bem, pois não considerava a transcendência que é própria do budismo.

2° Ato: A Arte
Renato Russo propõe um duelo entre o "tudo é dor" com a oportunidade de começar tudo de novo quando o sol bater na janela. Como artista, o cantor não precisa ter rigor metodológico na sua reflexão, é isso que torna lindo a arte, pois ela não tem obrigação de escolher um lado (pessimista ou otimista)

3° Ato: A Fé
O Apóstolo Paulo nos coloca em um lugar mais estranho ainda. Nem otimismo, nem pessimismo, nem mesmo o que flutua entre uma coisa e outra (como é possível em uma expressão artística). Talvez, correndo o risco de estar equivocado, poderia dizer que Paulo era um realista esperançoso (assim como se definia Ariano Suassuna). Paulo sabe que há uma realidade gloriosa no Porvir, mas também está consciente das tribulações do tempo presente. (Rm.8:14-28; II Co.12:5-9 )

Não adianta pensar a dor como algo sem solução ou como uma solução que virá. Na realidade estamos neste mundo no qual vivenciamos também dores, mas, a vida não se resume apenas a isso. Colocar a esperança na glória futura, não significa negar ou fingir que não está doendo, para alimentar uma expectativa de alívio e bem estar. Um espinho na carne dói, cumprir uma missão que "não queremos beber" dói, ir contra nosso instinto de sobrevivência e autodefesa (não retribuir agressão com agressão) dói, encontrar-se com a frustração de não ter atendida a expectativa, também dói. Um dia tudo isso vai passar. Mas, esta expectativa não basta para alimentar a fé. A solução do budismo é transcender dos desejos e se encontrará com a nossa essência fundamental. Paulo mostra outra saída. Ele reconhece que:
1.  é incapaz de fazer esta jornada pelo seu próprio esforço;
2.  há dores que são espinhos na carne (continuam conosco)
3.  há algo que "basta" e um poder que se aperfeiçoa. Na graça encontramos com a essência original (arkeo) e nas fraquezas/dores o propósito (teleolai)

Para dizer a verdade, não sei de onde vem a dor,  nem se o sol vai bater na janela. Sei apenas que na vida há dores, mas também outras coisas mais.

Esses três atos para pensar a dor resumem três perspectivas para lidar com a nossas questões. Podemos olhar as coisas pela reflexão filosófica, pela expressão artística e pela experiência de fé. Uma coisa não precisa estar desvinculada da outra. A filosófica pode nos despertar para questões mais profundas, enquanto que a arte nos faz aceitar um pouco nossas contradições, fruto do movimento que é existir no mundo. Essas duas dimensões não precisam ser negadas, para andarmos na fé. É possível um diálogo maduro entre a filosofia, as artes e a fé (entre nossos questionamentos, nossas percepções e nossa experiência religiosa). Porque a fé não é a garantia de uma explicação ou compreensão das coisas. Na perspectiva cristã, a fé é olhar para o Cristo e vê-lo suportando a Cruz. A fé se apresenta a nós quando temos a cruz e o ato da entrega de Cristo como aquilo que vai construir e consumar nossa experiência de fé para este tempo presente e para o que virá. (Hb.12:2). Ao olhar para aquele que pela alegria que lhe fora proposta, suportou a cruz, desprezando a vergonha, e assentou-se à direita do trono de Deus, experimentamos a fé naquilo que é proposto para nós.