Hoje é dia de falarmos sobre a justiça. Sobre como comunica a justiça connosco. O que nos diz. O que percebemos. Quem entende uma sentença de um tribunal? Sim, calma, sim, eu já aprendi que de chama habitual acórdão. Porque normalmente há mais do que um juiz. Mas isto é um podcast sobre comunicação e a mim, interessa-me particularmente como se comunica. Neste caso como comunica o sistema judicial com os cidadãos. Por isso falo das longas, palavrosas, complexas, cheias de referências cruzadas, e encriptadas decisões judiciais. Sendo que o tribunal é aquele sitio mágico onde os cidadãos vão reclamar que se garantam os seus direitos à luz da lei. Não posso deixar de partilhar a minha experiência pessoal, como testemunha, num par de processos. Senti-me pequenino, quase intimidado, e profundamente desconfortável. Nem sei bem porquê. Seria da mise-en-scène? O peso do formalismo? Da linguagem? Das vestes? Da luz? Dos juízes ocuparem um dois degraus acima de mim, do ministério público e advogados estarem um degrau acima. E eu, cá em baixo, a muitos metros de distância de quem decide. Isto também é comunicação. Quis discutir o tema com Conceição Gomes do Observatório da Justiça. Será que a nossa justiça é justa connosco, cidadãos? Em todos os sentidos da palavra As fronteiras da lei são formalmente claras. Mas a sua interpretação depende e muito de pessoas com convicções e olhares distintos. Tudo depende da função social e do contexto. A justiça tem uma tarefa difícil. Tem de decidir entre o devido e o dano. Entre o direito e o dever. Mas como tantas vezes acontece em sistemas complexos o cidadão é mais objecto do que beneficiário. Cabem-lhe poucas perguntas com muitas respostas codificadas. Nestes momentos penso num livro do escritor Franz Kafka, chamado “O processo”. Nele o personagem Josef K. é acusado num longo e incompreensível processo por um crime não especificado. É uma boa leitura para refletir sobre o tema da justiça e do seu relacionamento com o cidadão. Mas isso é coisa da fantasia dos livros. Nunca da vida real.