Hoje é dia de falar da loucura.
No sentido mais amplo do mundo.
Da saúde mental, da boa saúde, dos médicos psiquiatras, das dores de alma dos doentes, das famílias e dos seus vínculos.
É uma sopa rica de temas.
E por falar em comida, foi precisamente num jantar que conheci a Inês Homem de Melo.
Num jantar muito especial com pessoas de uma organização chamada Manicómio.
Que se dedica a integrar pessoas com doença mental através da arte.
E nesse jantar-debate foi-nos entregue a tarefa de moderar os comensais. Não na comida, mas na partilha de ideias.
E foi sem surpresa que se percebeu que isto da saúde mental, ou da falta dela, toca a todos, independentemente da sua condição social ou económica.
Nesta edição passeamos por esses labirintos das forças e fraquezas da nossa mente.
Inês Homem de Melo é médica psiquiatra. E também música.
Pensa rápido e ainda fala mais rápido.
Nesta conversa torrencial faço o papel do jogador que tenta acalmar o ritmo do jogo enquanto ela corre para marcar mais um par de golos na minha baliza.
A Inês pensou várias vezes em desistir do curso de medicina até que se encontrou com a psiquiatria. E isso mudou tudo.
Vamos por partes. Sendo isto um podcast sobre comunicação, Inês Homem de Melo faz questão de ter tempo para ouvir os seus doentes. Sim, ouvir. E falar com eles. E explicar tudo. E voltar ao início outra vez. É uma espécie de raro cuidado num mundo em aceleração desmiolada.
De que se fala no consultório da Inês?
De sofrimento. Principalmente de sofrimento. Afinal vamos ao psiquiatra quando algo nos dói muito cá dentro.
E não dá para encontrar respostas fazendo análises, radiografias ou TACs.
Só se chega lá pela palavra dita. Pela palavra escutada. Pela fala interpretada. Pela reinvenção dos significados.
É neste momento em que juntar a ciência e a criatividade dá um grande jeito.
Em momentos em que é importante entender a fronteira entre o normal e o patológico.
No fundo, o assumir da absoluta diversidade que somos apagando o conceito do que é normal. O normal é um conceito, talvez, demasiado valorizado.
Posto isto, apertem os cintos. Vem aí uma conversa sobre famílias, adolescentes, drogas, vínculos emocionais, conflitos existenciais, pessoas com défice de atenção, depressões e ansiedades.
Tópicos:
[00:00:00] Abertura
[00:00:13] Loucura, Saúde, Arte Na Psiquiatria
[00:07:22] Diagnóstico E Fronteira Da Normalidade
[00:12:39] Síndrome do Impostor e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperactividade TDAH
[00:17:33] Psicodrama
[00:29:30] Emoções Intensas E Doença Mental
[00:39:40] Intervenção Precoce Na Saúde Mental
[00:48:43] Relações De Vinculação E os seus Impactos
[00:59:40] O Tempo É Relativo.
LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO
TRANSCRIÇÃO AUTOMÁTICA
0:00:13 - JORGE CORREIA
Olá vivão.
0:00:14 -
Bem-vindos ao Pregunta Simples, o vosso podcast sobre comunicação.
Hoje é dia de falar da loucura no sentido mais amplo e lato do mundo da saúde mental, da boa saúde dos médicos, psiquiatras, das dores de alma dos doentes, das famílias e dos seus vínculos. Desde a mais tem realidade. É uma sopa rica de temas. E por falar em comida, foi precisamente num jantar que conheci Inês Homem de Mélod, um jantar na ordem dos médicos, um jantar muito especial com pessoas de uma organização chamada Manicómeo, que se dedica a integrar pessoas com doença mental através da arte. E nesse jantar de bate foi-nos entregue a tarefa de moderar os comensais não na comida mas na partilha de ideias. E foi sem surpresa que se percebeu que isto da saúde mental, ou da falta dela, toca a todos, independentemente de sua condição social ou econômica. Nesta edição vamos passear por esses labirintos das forças e das suas coisas da nossa mente. Inês Homem de Mélod é médica, psiquiatra e também música. Pensa rápido e fala ainda mais rápido. Nesta conversa torrencial eu faço o papel do jogador que tenta acalmar o ritmo do jogo enquanto ela corre para marcar mais um par de golos na minha baliza. Em Inês, penso que às vezes em desistir do curso de medicina até que se encontrou com a psiquiatria E isso mudou tudo. Vamos saber como Vamos por parte.
Sendo isto um podcast sobre comunicação, inês Homem de Mélod faz questão de ter tempo para ouvir os seus doentes. Sim, ouvir e falar com eles e explicar tudo e voltar ao início outra vez, é uma espécie de raro cuidado num mundo em aceleração desmiolada. Então, e do que se fala no consultório de Inês? De sofrimento, principalmente de sofrimento. Afinal, vamos ao psiquiatra quando nos dói algo muito cá dentro, e não dá para encontrar respostas fazendo análises, radiografias ou taques.
Só se chega lá pela palavra dita, pela palavra escutada, pela fala interpretada, pela reivensão dos significados. Claro, depois há bioquímica, mas a palavra é fundamental. É nesse momento em que juntar a ciência e a realidade dá um grande jeito, em momentos em que é importante entender a fronteira entre o normal e o patológico. No fundo, o assumir dá a absoluta diversidade de que somos todos feitos, apagando o conceito do que é normal. O normal é um conceito talvez demasiado valorizado, posto visto, apertem os cientes, venham a uma conversa sobre famílias adolescentes, drogas, vínculos emocionais, conflitos existenciais e pessoas com déficits de atenção, mas que funcionam lindamente real. Falamos também de depressões e ansiedades, e também de doenças mentais graves de que quase ninguém fala. Como é que esta mulher ainda duvidou que há algum dia ia ser médica psiquiatra? Como Inês, como?
0:03:23 - INÊS HOMEM DE MELO
Eu fiz o curso de medicina a prenar o tempo todo, todas as épocas, dizemos anunciava a família que ia ser médica. Porque dizemos que? Então, por que? Porque eu achava aquele muito teórico e pouco incentivo à criatividade criasse uma coisa mais solta, até que na cadeira de psiquiatria percebi que não chegava atrasada às aulas e foi uma luz É um clique.
0:03:52 - JORGE CORREIA
a motivação era Eu estava muito motivada.
0:03:56 - INÊS HOMEM DE MELO
Adorava os professores, os temas que eles traziam para cima da mesa, a sua forma de comunicar com os alunos e encontrei o lugar onde ia ser feliz. A partir daí já fiz o curso com conforto. Já sabia que chegava ao fim e que tinha um caminho. Porque o curso é difícil? não é, o curso é desumano.
0:04:16 - JORGE CORREIA
É desumano em quê? Como é que é estudar medicina? Conta-me porque tenho essa curiosidade.
0:04:22 - INÊS HOMEM DE MELO
É uma quantidade de matéria aborrente. Há estudos sobre isso que equivale a aprender não sei quantas línguas em número de palavras que a gente aprende. Os médicos falam medicais, não é. Não dizem Dorme no peito. Dizem pré-cordialgia, não dizem. Ou exemplos mais simples as pessoas Há uma linguagem muito própria, totalmente. É possível ouvir uma conversa entre dois médicos e não perceber nada. Então se forem oftalmologistas, é que nem os alunos, não é siglas, nem os outros médicos percebem o que eles dizem. Portanto, era uma explosão de coisas a reter, mas num sentido pouco criativo que era o que mais maliciava, era aprender coisas que me fizessem sentir, é isso criativa E eu encontrei isso na psiquiatria.
0:05:14 - JORGE CORREIA
Até. Mas qual é a diferença entre oftalmologia, entre cirurgia, entre cardiologia e a especialidade de psiquiatria? Porque eu olho para os médicos psiquiatras e é fácil notar que eles são diferentes. Não é, São outra coisa.
0:05:27 - INÊS HOMEM DE MELO
Até os nossos colegas médicos dizem isso. Os psiquiatras são todos malucos E eu adoro. Sabe que eu adoro esse rótulo. Eu adoro esse rótulo Porque, se é assim, então que seja. Ande no hospital e faça qualquer desesperado.
0:05:42 - JORGE CORREIA
Vamos aproveitar. Já que nós só dizem que nós somos assim, a gente vai e aproveita.
0:05:46 - INÊS HOMEM DE MELO
Jorte, eu acho que a psiquiatria atrae pessoas tendência realmente fora da caixa por ser uma especialidade com esse rótulo e por ser tão tolerante. Nós trabalhamos com a diferença do comportamento humano, de maneira que nós também nos damos ao luxo de nos dedicarmos a outras áreas fora da medicina.
0:06:04 - JORGE CORREIA
E de poder ser diferente, de poder achar que essa diferença é normal, no fundo de isto.
0:06:10 - INÊS HOMEM DE MELO
A diferença é que dá o brilho ao mundo. O único tipo de pessoas pelos quais eu não me sinto atraída são as pessoas normais. Dá um garoto, faz qualquer coisa.
0:06:24 - JORGE CORREIA
Meste E se tem a ver com o, que Tem a ver com a curiosidade sobre o ser humano, sobre a maneira como, porque no teu trabalho tu recebes pessoas lá está muito diversas, em sofrimento. Imagino O que é que elas te dizem, o que é que dizem as pessoas que entram no teu consultório.
0:06:41 - INÊS HOMEM DE MELO
As pessoas normalmente vêm ao psiquiatra com mais notícias ou com dor. Nunca vêm se celebrar um acontecimento, um ritual de passagem feliz, a não ser que sejam nossos doentes. há tanto tempo que até se não esse luxo Uau, consegui.
0:07:01 - JORGE CORREIA
Olha, recuprei No fundo, ao contrário dos obstetras que lá vão para em busca de uma boa notícia vamos ter um bebê já vinha. Um bebê já está. uma coisa boa, em princípio, quando te entram no consultório. Como é que tu observas logo esse primeiro momento em que entram no consultório?
0:07:19 - INÊS HOMEM DE MELO
Já está a contar. Já está a contar. Há suspeitas diagnósticas que se fazem da sala de espera para o consultório, nomeadamente na área em que eu mais me digo, que é o neurodesenvolvimento e que afeta também a parte motora. Portanto, como é que a pessoa anda com harmoniosos aos seus movimentos, como é que nos comprimenta Se nos olha nos olhos, se nos estenda a mão de uma forma harmoniosa ou rígida, quais são as primeiras palavras que escolha? Se é assim trópico ou se é fluido, espontâneo, nos dois sentidos, porque também se for muito falador, logo, muito próximo,