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Meditações no Evangelho de João (25): Muito maior do que a tradição

O fenômeno religioso é parte integrante da existência humana. Humanidade e religiosidade formam uma combinação inseparável, pois o homem foi criado para adorar. Existem algumas possibilidades etimológicas para o termo “religião”. A que possui maior plausibilidade, porém, é a que explica a palavra religião como sendo derivada do vocábulo latino “religare”, que significa “atar, ligar, restaurar um laço que foi rompido.” Assim sendo, podemos dizer que a religião é o meio pelo qual as pessoas procuram a religação com o Criador, que foi perdida na rebelião no Éden. Biblicamente, o restabelecimento da comunhão com Deus não acontece por meio da religião, qualquer que seja ela, mas por intermédio de Jesus Cristo, o único e verdadeiro Mediador entre Deus e os homens.

Entender os fundamentos da religiosidade nos ajuda a compreender por que as crenças são tão envolventes. Essa é a razão por que Jesus encontrou tanta resistência por parte dos religiosos judeus. A nação de Israel tinha uma longa tradição religiosa, cujas origens datavam principalmente da época de Moisés. E, embora muitos componentes do judaísmo fossem provenientes do Pentateuco, com o passar do tempo, a tradição rabínica foi afastando-se das Escrituras. Tal afastamento se fez com tanta intensidade que, à época de Cristo, a religião havia superado a revelação de Deus. 

Os judeus veneravam seus patriarcas e mestres da antiguidade, entre os quais Moisés recebia indisputável proeminência. Eles achavam que, se Jesus era de fato o Messias, como Ele dizia ser, deveria fazer descer pão do Céu, como fizera Moisés. Vendo que seus opoentes não entenderam Moisés, nem a mensagem dos sinais que se fizeram por meio dele, Jesus respondeu: “Eu sou o pão da vida. Vossos pais comeram o maná no deserto e morreram. Este é o pão que desce do céu, para que todo o que dele comer não pereça. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém dele comer, viverá eternamente; e o pão que eu darei pela vida do mundo é a minha carne” (João 6.48–51).

Assim como Jesus chamou a Si mesmo de “Senhor do sábado”, agora Ele afirma que os rabinos e fariseus estavam enganados quanto à exagerada veneração por Moisés e pelo sinal do maná. Na verdade, a rejeição a Cristo não se poderia creditar à falta de um sinal poderoso, pois Jesus acabara de multiplicar cinco pães e dois peixinhos até ao ponto de alimentar cerca de dez mil pessoas. Um sinal miraculoso tem pouco efeito espiritual para uma pessoa que está envolvida na tradição religiosa, qualquer que seja ela. Mais do que o pão material, Jesus se apresenta como o pão da vida, cuja substância e poder perdura eternamente. Jesus iria entregar sua vida na cruz, a fim de que, e desse modo, sua vida servisse para alimentar a necessidade eterna daqueles que desejavam saciar suas almas na comunhão ou religação com Deus. 

João, capítulo 6, termina com a multidão se afastando de Jesus. E assim percebemos que, mesmo uma tradição religiosa recheada de rituais e ideias manifestadas ou ilustradas na própria Escritura, poderá cegar os olhos do nosso coração, privando-nos da realidade que está em Cristo.

É compreensível que aprendamos com aqueles que deixaram um exemplo de fé admirável. A Bíblia nos ordena seguir os líderes fieis e imitar a fé que eles tiveram. No entanto, a despeito do admirável legado que tais líderes deixaram, nenhum deles deveria ser admirado de um modo que nos impedisse de contemplar o próprio Cristo. Se isso acontecer, é porque a religião tomou o lugar da verdade, e isso é muito sério.