Por Santo Afonso Maria de Ligório.
Diz São João que, achando-se os apóstolos juntos numa casa e estando as portas fechadas, Jesus Cristo ressuscitado entrou ali. E pondo-se no meio, disse-lhes duas vezes: A paz esteja convosco. Repetiu as mesmas palavras oito dias depois, aparecendo-lhes mais uma vez, estando fechadas as portas. “A paz esteja convosco”. Com estas palavras Jesus Cristo quis nos dar a entender “que Ele é a nossa paz. Ele, que dos dois fez um, desfazendo em sua carne, com o sacrifício de sua vida, o inconsistente muro de separação, as inimizades”.
Com efeito: só em Deus se acha a verdadeira paz; porque, tendo Deus criado os homens para si mesmo, o Bem infinito, só Ele pode plenamente satisfazê-los. Diz a Escritura: “Deleita-te no Senhor, e Ele concederá o que teu coração deseja”. Quando alguém encontra as suas delícias só em Deus e não busca coisa alguma fora d’Ele, Deus cuidará em satisfazer-lhe todos os desejos do coração.
Insensatos portanto são aqueles que dizem: Bem-aventurado aquele que pode gastar dinheiro à vontade! Aquele que pode mandar nos outros! Aquele que pode gozar os prazeres que deseja. Loucura! Bem-aventurado é somente aquele que ama a Deus, aquele que diz de verdade que só Deus lhe basta. A experiência demonstra, com muita evidência, que muitos dos que o mundo chama felizes, por grandes que sejam as suas riquezas e altas as suas dignidades, todavia levam vida infeliz, nunca estão contentes, jamais gozam um dia de verdadeira paz. Ao contrário, existem tantos bons religiosos que vivem num deserto ou numa gruta, sujeitos a enfermidades, à fome, ao frio, que estão contentes e exultam de alegria. E qual o motivo disso? É porque, já que eles só se ocupam com Deus, então Deus os consola.
Ah! A paz que o Senhor faz provar a quem O ama, está acima de todas as delícias que o mundo pode dar! A paz de Deus supera todo entendimento.
“Provai e vede quão suave é o Senhor”. Ah, mundanos! Exclama o Profeta, porque desprezais a vida dos santos, sem que a tenhais experimentado? Experimentai essa vida uma única vez: afastai-vos do mundo, dai-vos a Deus, e vereis como Ele sabe vos consolar muito melhor do que todas as grandezas, e delícias que andais procurando para vossa perdição. É verdade que também os santos sofrem na vida presente grandes tribulações; mas com a resignação à vontade de Deus, nunca perdem a paz. Numa palavra, eles estão acima das adversidades e vicissitudes deste mundo, e por isso vivem sempre numa tranquilidade imperturbável.
Mas quem quiser estar sempre unido com Deus e gozar contínua paz, deve banir do coração tudo o que não seja Deus, guardar as portas dos sentidos fechadas a todas as criaturas e viver como que morto aos afetos terrestres. É exatamente o que o Senhor quis dar a entender, quando, na aparição aos apóstolos, entrou duas vezes, como narra o Evangelho, estando fechadas as portas. “Em sentido místico”, explica Santo Tomás, “devemos aprender disso que Jesus Cristo não entra em nossas almas enquanto não tivermos fechado as portas dos sentidos”.
Pai Eterno, pelo amor de Jesus Cristo, ajudai-me a romper todos os laços que me prendem ao mundo. Fazei com que eu não pense em outra coisa senão em Vos agradar. Felizes daqueles a quem só Vós bastais! Senhor, dai-me a graça de não buscar nada fora de Vós e de não desejar senão o vosso amor. Por vosso amor renuncio também às consolações espirituais. Nada mais desejo senão cumprir a vossa vontade, e dar-Vos gosto.
Ó Mãe de Deus, Maria, recomendai-me a vosso Filho, que não vos nega nada.