No momento da gravação deste episódio, o cacique Aritana Yawalapiti, liderança do Alto Xingu, está internado em estado grave em uma unidade de terapia intensiva do Mato Grosso. Aos 71 anos, ele contraiu a covid-19 e foi levado às pressas a um hospital de Canarana, a 838 quilômetros de Cuiabá, depois do agravamento dos sintomas respiratórios. Como ele, outras referências indígenas, de várias etnias, se contaminaram com o coronavírus. Alguns sobreviveram, outros não. Também no dia da gravação deste episódio, foi confirmada a morte por covid-19 do cacique Domingos Venite, de 68 anos, da aldeia Sapukai, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Junto com as vidas destas lideranças, são perdidos conhecimentos específicos e ancestrais concentrados nestas figuras, que são uma espécie de guardiões dos saberes. São livros vivos.
Em março, o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena, a Sesai, apresentou medidas para ajudar a prevenir o contágio. 12 documentos foram elaborados com informações e orientações e destinados aos 34 Distritos Especiais de Saúde Indígena responsáveis pelo atendimento a quase 800 mil indígenas aldeados em todo o Brasil. Os indígenas que vivem nas cidades não são considerados nos dados e nas diretrizes da Sesai. E mesmo os protocolos específicos não foram suficientes.
Dados da APIB, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, mostram 137 povos afetados pela pandemia até agora. Os casos confirmados de contaminação passam de 16.800. Destes casos, ainda segundo a APIB, mais de 12.000 infecções ocorreram em territórios indígenas. E 544 mortes foram registradas nas populações indígenas. As regiões do Alto Solimões e do Alto Rio Negro são as mais afetadas. Neste episódio do Elas com Elas, vamos entrar um pouco nos impactos da pandemia de coronavírus entre a população indígena, olhando para as questões sanitárias, mas também para os aspectos e movimentos sociais e culturais. Vamos falar sobre essas figuras que são depositórios de conhecimento e vamos passar também por uma questão apontada durante as entrevistas pelas mulheres com quem conversamos: o aumento da presença de grupos evangelizadores cristãos nos territórios indígenas em meio à pandemia.